
Palestinos
no Recife
Um mergulho na história da comunidade palestina do Recife: Do século XIX até os dias atuais.

Palestina - Recife
A distância de 8.648 km que separa, geograficamente, a Palestina e a cidade do Recife, não representa, de fato, a proximidade entre esses dois territórios. Desde o século XIX, palestinos, em sua maioria habitantes de Belém, vêm morar na capital de Pernambuco. Números indicam que cerca de 5000 palestinos residem no Recife, sem contabilizar seus descendentes.
No Recife, os palestinos, historicamente, encontraram um ambiente favorável à adaptação. A culinária, a música, a religião, foram fatores de convergência e até de assimilação com a cultura pernambucana. Hoje, a comunidade é, em sua maioria, formada por descendentes das famílias que chegaram no século passado. Essa distância temporal é só um detalhe, já que suas lutas e reivindicações continuam as mesmas.
Palestinos no Recife – Imigração,
cultura e resistência
A luta, o passado e o presente da comunidade palestina do Recife, desde a sua chegada no século XIX até os dias atuais.
Publicado em 11/06/2018
A distância de 8.648 km que separa, geograficamente, o atual território palestino (o qual agrega três regiões não contíguas: a Cisjordânia, a Faixa de Gaza e Jerusalém Oriental) e a cidade do Recife, no Brasil, sugere que esses pontos, dificilmente, possuem algo em comum. Mas não é o que afirma o mestre em antropologia, Hissa Mussa Hazin, que em seu mestrado, elaborou uma dissertação com o seguinte tema: “Imigrantes palestinos, identidades brasileiras: compreendendo a identidade palestina e as suas transformações”.
Hissa é membro da Aliança Palestina do Recife, uma associação criada no ano de 2014 (ano do massacre em Gaza, onde 2.200 palestinos foram mortos, segundo a ONU) que reúne pernambucanos adeptos a causa palestina (sejam descendentes ou não), cujo objetivo consiste em apoiá-la: Por meio de doações a Gaza, realizando manifestações nas ruas da cidade, promovendo eventos e debates sobre o tema e fazendo com que os cidadãos recifenses se solidarizem com a atual situação em que se encontra a Palestina.
Parte da análise em seu mestrado ficou reservada para o estudo da inserção de um grupo de imigrantes palestinos que chegou ao Recife, ainda no final do século XIX. “Quando esse povo veio da palestina para cá, eles não eram palestinos porque não existia a Palestina ainda. A Palestina começou a existir em 1922, após a 1ª Guerra Mundial. Então, eles eram árabes que viviam no território que hoje compreende a Palestina, embora seja dominada por Israel, mas hoje é a Palestina.”, explicou Hissa.
O principal motivo da imigração foi o financeiro. “Naquela ocasião, eles vieram para o Brasil com a intenção de ganhar algum dinheiro, fazer um pé de meia e voltar para a terra deles, para tentar melhorar as condições da família.” Mas não foi bem isso o que aconteceu, pois a situação na Palestina durante aquela época estava muito ruim, contou Hissa. “Daí, durante a 1ª Guerra Mundial, a Alemanha lutou ao lado do então Império Otomano (atual região pertencente à Turquia), em batalha contra a Inglaterra, em 1917. Os britânicos saíram vitoriosos e passaram a dominar a região da Palestina”.
E com os britânicos no controle, os imigrantes não puderam voltar para suas terras. “Era muito arriscado. Não havia condições de voltarem e viverem em paz. Foi aí que a conexão se iniciou: Tiveram filhos aqui no Brasil, passaram a viver e morar aqui. Se deu início a um processo de Assimilação.”, explicou. Para ele, os membros da comunidade palestina do Recife se transformaram em brasileiros.
“A assimilação é exatamente isso. Você passa a se sentir como brasileiro e não se sente mais palestino. É como se a Palestina não lhe dissesse mais respeito. Grande parte da comunidade daqui do Recife passou por esse processo.”, contou Hazin, que também narrou fatores contribuintes para esse processo cultural.
“A imigração do Recife não tem nada a ver com a imigração do Sul do país. Esta última ocorreu na metade do século XX. A Daqui é cristã, a de lá, muçulmana. Na imigração daqui, todos vieram de uma mesma cidade, que é Belém. Então, por ser cristã, ela se assimilou muito facilmente com a religião católica, pois a predominância lá era da religião ortodoxa, muito similar à religião católica, predominante aqui no Recife. Esse fato facilitou muito os processos de assimilação e aculturação.”
Além da religião, a fácil adaptação à alimentação brasileira, o gosto pela música local e perda das raízes musicais e o quase nulo contato com parentes na Palestina, também tiveram papel importante nos processos culturais. “Poucos dos que vieram, mantiveram parentes lá. Foi uma diáspora realmente o que aconteceu com a Palestina”, frisou.
Segundo Hissa, Belém, que era uma cidadezinha de 8 a 10 mil habitantes, conseguiu colocar cerca de 450 mil descendentes de palestinos na América do Sul, e desses, em torno de 40 mil estão no Brasil. Apesar de viverem em paz no Recife, os resultados dos processos de assimilação e aculturação não foram totalmente positivos: Por se sentirem brasileiros, poucos são aqueles descendentes que vão às ruas se manifestar por suas verdadeiras raízes.
“O que surpreende aqui em Pernambuco é a pouca adesão a causa. Embora todo mundo diga que aceita, que é contra o que Israel está fazendo, com todo genocídio e todas invasões de terras por parte deles, isso tudo é verdade e é dito pela população daqui. Mas na hora de protestar e lutar, de ir a rua, poucos estão presentes”, desabafou Hazin, em tom melancólico.
E isso não ocorre no resto do Brasil: Rio Grande do Sul, Curitiba, São Paulo entre outros estados que também possuem comunidades palestinas, a adesão é grande. “Isso se dá por alguns fatores, entre eles, o da religião. Como já disse antes, esse grupo que imigrou para o sul do país é, predominantemente, muçulmano. A religião é um ponto forte. Eles ainda se sentem palestinos.”
Apesar da situação atual da Palestina continuar desfavorável, para Hissa, ainda existe esperança. “Continuarei lutando. Promovendo manifestações aqui com o pessoal da Aliança, arrecadando mantimentos para enviar, sempre que possível tentar ajudar. Temos uma página no Facebook com pouco mais de 5 mil membros. Espero que cada vez mais as pessoas passem a enxergar e se solidarizar com a causa palestina”.
A causa palestina no Recife
Na noite do dia 22 de maio, no Recife, manifestantes a favor da causa Palestina e integrantes da Aliança Palestina do Recife organizaram uma manifestação contra uma homenagem feita a Israel, na Assembléia Legislativa de Pernambuco (ALEPE). A deputada estadual Priscila Krause organizou, em comemoração aos 70 anos de Israel, uma reunião solene seguida de um luxuoso jantar no prédio do órgão. Poucos dias antes, 14 de maio, em Gaza, pelo menos 55 pessoas morreram e 1200 ficaram feridas por fogo das Forças de Defesa de Israel (IDF) em protestos contra a abertura da embaixada dos Estados Unidos em Jerusalém. O dia mais sangrento em Gaza desde 2014. No mês do aniversário de Israel.
‘’Como você homenageia um ‘estado nação’ sendo um ente municipal? Principalmente numa semana após Israel promover um massacre, colocando atiradores de elite contra manifestantes palestinos armados com pedras‘’, questiona em tom de revolta, André Frej, um dos líderes da manifestação, em um caminhão de som estacionando na frente da ALEPE.
André é jornalista, descendente palestino e membro da Aliança Palestina do Recife. ‘’Eu estive na Palestina com 9 anos, e mesmo ainda criança conseguia perceber a situação de ocupação. Você andava nas capitais de Belém e sempre tinha um soldado israelense armado em cada esquina. Às vezes passavam o fuzil pela minha barriga e na do meu irmão.’’ relembra, com muito pesar.
A manifestação segue. Mais adeptos da causa foram chegando e discursando em frente ao prédio. Judeus convidados para a homenagem também apareceram no local. A Rua da União, pouco a pouco, foi se tornando uma representação da disputa secular entre Israel e Palestina. Aqui, ao menos, os lados dispõem de um arsenal não tão díspar, mesmo com a ronda e olhares da polícia, que encarava os manifestantes enquanto conversava com os convidados do jantar.
No lugar das armas e pedras, estava o discurso. E um deles se destacou pela incisão: a fala de uma das fundadoras da Aliança Palestina do Recife, Angélica Reis. ‘’Israel tem tanques de guerra, navios bombardeando, caças sobrevoando por territórios palestinos. Isso não é uma guerra, é um genocídio. Não tem porque se defender de uma pedra com um rifle R15. ‘’, contestou.
Angélica se tornou solidária a causa palestina, após procurar fontes alternativas à grande mídia para se informar sobre o conflito. ‘’Eu acreditava demais no que eu via na TV. Mas em 2014, quando vi o bombardeio na faixa de Gaza, eu percebi que alguma coisa estava errada. Então, eu entrei contato com palestinos tanto em Gaza como na Cisjordânia. E aí, percebi que não se trata de escolher um lado, se trata do direito à vida e à justiça. É sobre resistência.’’, contou.
Hoje, com a ajuda de algumas organizações de esquerda, ela organiza atos e administra campanhas, expondo a realidade da Palestina no Recife, onde, o principal objetivo é o de reunir palestinos e recifenses adeptos a causa. ‘’Nesse Brasil polarizado, a gente tem uma esquerda e direita muito bem definida. Então, a esquerda, como apoiante das causas dos oprimidos, é de onde recebemos maior ou total apoio, pois da direita, não temos nenhum.”, frisou Angélica, completando: “Seguirei na luta para, quem sabe um dia, a Palestina seja totalmente livre do controle de Israel.”
Palestina livre!
Fotos da manifestação em favor à causa palestina, na frente da Assembléia Legislativa de Pernambuco. 22/05/2018




Culinária árabe/palestina no Recife
O restaurante Papaya Verde, localizado no bairro do Espinheiro no Recife, funciona há 20 anos, sendo referência em comida e atendimento de qualidade. Um dos seus sócios é o palestino João Asfora. Nas terças e quintas, o restaurante serve um buffet com deliciosos pratos tradicionais da culinária árabe/palestina.
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